Quanto vale um médico?
Por Renato Azevedo Júnior, Conselheiro e diretor do Cremesp
Peço a atenção e a paciência do leitor para alguns números, retirados da Tabela de Remuneração dos Servidores Públicos Federais, publicação de março de 2008, do Ministério do Planejamento. Seguem abaixo valores de salários iniciais de algumas categorias profissionais, acrescidos, se for o caso, de gratificações:
Auditor da Receita Federal = R$ 10.155,32;
Procurador da Faz. Nacional = R$ 11.238,98;
Delegado da Polícia Federal = R$ 12.992,70;
Médico da Seguridade Social (40h semanais) = R$ 2.380,54.
O que constatamos com esses exemplos é que a diferença salarial inicial entre um delegado da Polícia Federal e um médico da Seguridade Social é de 445,80%. No Estado de São Paulo – o mais rico da Federação –, o salário inicial de um médico por 20 horas semanais é de R$ 1.756,71 (ou R$ 3.513,42, se o servidor cumprir 40 horas), valor que não se compara ao salário inicial de um procurador do Estado, que é de R$ 8.161,59.
Nas prefeituras paulistas, a média dos salários por 20 horas semanais gira em torno de R$ 2.200,00. Sem desmerecer outras categorias profissionais, mas a fim de demonstrar a imensa defasagem salarial em que se encontra a classe médica, cumpre salientar que a formação de um médico implica seis anos de graduação em tempo integral, de dois a três anos de especialização, além da aquisição de livros caríssimos, noites mal dormidas em estudos e plantões, uma eterna atualização científica e uma grande responsabilidade nas decisões – inerente à profissão – que afeta diretamente a saúde de pessoas. Se a faculdade for particular, estima-se que o aluno irá gastar, somente com mensalidades escolares, cerca de R$ 252.000,00 para concluir o curso. Como conseqüência deste descaso da Administração Pública para com o profissional médico que atua em seus serviços no âmbito federal, estadual ou municipal, uma crise se abate sobre o sistema público de saúde.
No Estado de São Paulo é quase impossível contratar médicos para trabalhar na periferia da Capital; e no Interior há grandes dificuldades em contratar médicos em especialidades básicas, como pediatria, por exemplo. No Brasil, médicos pedem demissão em massa do Serviço Público, como ocorre atualmente em Pernambuco. A adequada remuneração do médico não é uma questão meramente corporativa, mas sim uma questão de interesse da sociedade e de defesa da boa prática médica para a população. O direito à saúde é um dos objetivos fundamentais do Estado Brasileiro, previsto na Constituição, e o médico é o instrumento de alcance desta finalidade. O próprio Código de Ética Médica dispõe em um de seus Princípios Fundamentais, no art. 3º: "A fim de que possa exercer a Medicina com honra e dignidade, o médico deve ter boas condições de trabalho e ser remunerado de forma justa."
O médico, assim como as outras profissões acima citadas, deve ter uma Carreira de Estado no Serviço Público, com a ambiciosa meta de haver pelo menos um médico em cada cidade do país. Qual a solução para isso? É a sociedade brasileira perceber que assistência médica é prioridade, que o SUS é uma conquista do povo brasileiro ainda a ser concretizada, e que sem uma valorização do profissional da saúde, a começar pelo médico, não haverá a desejada implantação do SUS. Receber uma assistência médica adequada é um direito fundamental da pessoa humana. Talvez a sociedade brasileira ainda não tenha se apercebido deste fato.
Afinal, quanto vale um médico?